sábado, 31 de março de 2012

Não podemos separar Deus do sofrimento dos inocentes - José Pagola

por Instituto Humanitas Unisinos (IHU)

A leitura que a Igreja propõe neste domingo é o Evangelho de Jesus Cristo segundo Marcos 14, 1-15,47 que corresponde ao Domingo de Ramos, ciclo B do Ano Litúrgico. O teólogo espanhol José Antonio Pagola comenta o texto.

Eis o texto.

Identificado com as vítimas

Nem o poder de Roma nem as autoridades do Templo puderam suportar a novidade de Jesus. Sua forma de entender e de viver Deus era perigosa. Não defendia o império de Tibério; chamava todos a procurar o Reino de Deus e sua justiça. Não considerava importante quebrar as leis do sábado nem as tradições religiosas; somente lhe preocupava aliviar as dores das pessoas enfermas e desnutridas da Galileia.

Mas isso não foi perdoado. Ele se identificava demais com as vítimas inocentes do império e com os esquecidos pela religião do templo. Executado sem piedade em uma cruz, nele Deus revela-se a nós sempre identificado com todas as vítimas inocentes da história. Junto ao grito de todos , eles unem-se agora ao grito da dor do mesmo Deus.

Nesse rosto desfigurado do Crucificado revela-se a nós um Deus surpreendente, que quebra nossas imagens convencionais de Deus e põe em questão toda prática religiosa que tente dar culto a Deus, esquecendo o drama de um mundo no qual se segue crucificando aos mais frágeis e indefesos.

Se Deus foi morto identificado com as vítimas, sua crucifixão converte-se num desafio inquietante para os seguidores de Jesus. Não podemos separar Deus do sofrimento dos inocentes. Não podemos adorar o Crucificado e viver dando as costas ao sofrimento de tantos seres humanos destruídos pela fome, guerras e miséria.

Deus continua interpelando-nos desde todos os crucificados do nosso tempo. Não podemos continuar vivendo como expectadores desse sofrimento tão grande, alimentando nossa ingênua ilusão de inocência. Temos que nos manifestar contra essa cultura do esquecimento que permite isolarmos dos crucificados deslocando o sofrimento injusto que há no mundo para uma distância onde desapareça o clamor, o gemido e o pranto.

Não podemos nos fechar em nossa sociedade do bem-estar, ignorando essa outra sociedade do mal-estar na qual milhares de pessoas nascem somente para extinguir-se aos poucos anos de uma vida que somente foi morte. Não é humano nem cristão nos instalar na seguridade esquecendo aos que somente conhecem uma vida insegura e continuamente ameaçada.

Quando os cristãos dirigiram seus olhos até o rosto do Crucificado, eles contemplaram o amor imenso de Deus que se entregou até a morte por nossa salvação. Se olharmos mais detidamente, logo descobriremos o rosto de muitos crucificados que, longe ou perto de nós, estão reclamando nosso amor de solidariedade e compaixão.

segunda-feira, 26 de março de 2012

Do Cebi

A vida mais forte que a morte - Raymond Gravel

Todo dom de si, todo avanço, toda morte em si mesma, molda nosso ser de eternidade. Nossa ressurreição já começou.

A reflexão a seguir é de Raymond Gravel, sacerdote de Quebec, Canadá, publicada no sítio Culture et Foi, comentando as leituras do 5º Domingo de Quaresma (25 de março de 2012). A tradução é de Susana Rocca.

Eis o texto.

Referências bíblicas:

1ª leitura: Je 31,31-34

Evangelho: Jo 12,20-23

Cada vez mais nós nos aproximamos da festa da Páscoa, a festa das festas, a festa do Amor por excelência, a festa da Ressurreição, da Vida. Que imagens utilizar para experimentar a Vida com V maiúsculo, a vida mais forte que a morte? A vitória do Cristo da Páscoa? São João, no seu evangelho, utiliza a imagem do grão de trigo...

1. O semeador se faz semente: Lembremos desta bela parábola de Mateus: "O semeador saiu para semear" (Mt 13,3). Como os evangelhos foram escritos após a Páscoa, esse semeador é já o Cristo Ressuscitado, saído de Deus para semear a semente do Reino, a semente do Reino do Amor. Mas esse semeador, o Verbo feito carne, em São João, se fez semente, grão de trigo caído na terra para fecundar. O teólogo francês Michel Hubaut escreve: "Essa pequena parábola do grão que morre para renascer é uma das mais ricas dos evangelhos. Só ela valeria um tratado inteiro sobre a encarnação, a redenção, a fecundidade secreta de toda vida animada pelo amor, o mistério do dom de si que faz surgir a vida".

Eis a lógica do Amor: o Amor não pode fazer outra coisa senão dar a vida. Mas para expressar-se na sua totalidade, ele deve ir até a morte: "se o grão de trigo não cai na terra e não morre, fica sozinho. Mas se morre, produz muito fruto" (Jo 12,24). Um grão de trigo depositado num prato na borda da janela fica um grão de trigo durante séculos... Por outro lado, se o colocarmos na terra, na noite, na umidade e no frio, o grão vai transformar-se para se converter em espiga de trigo com uma multidão de grãos de trigo. Assim também acontece com aquele ou aquela que nós amamos. Mas por quê? Simplesmente porque o Amor, para existir e subsistir, não pode fazer sofrer e morrer aquele ou aquela que deseja amar. Um dia ou outro, todos devermos nos ultrapassar a nós mesmos, essa é a hora do Amor que vai exatamente até o final de nós mesmos, como a hora da mulher grávida, pois o Amor dá a vida: "Quando a mulher está para dar à luz, sente angústia, porque chegou a sua hora. Mas quando a criança nasce, ela nem se lembra mais da aflição, porque fica alegre por ter posto um homem no mundo" (Jo 16,21). Eis por que, para examinar a totalidade do Amor, Jesus entregou a sua vida para que nós tenhamos Vida: "Não existe amor maior do que dar a vida pelos amigos" (Jo 15,13).

2. O Amor é divino: Lembremos esse tão bonito poema do Cântico dos Cânticos que diz: "Grave-me,como selo em seu coração,como selo em seu braço;pois o amor é forte, é como a morte!Cruel como o abismo é a paixão.Suas chamas são chamas de fogo,uma faísca de Javé!" (Ct 8,6). Esse grão de trigo que morre e dá seu fruto é um símbolo deslumbrante da vida pascal de todo cristão que deve escolher entre uma vida estéril ou uma vida fecunda. Não é nunca sem dor! Todos nós somos convidados a entrar neste mistério da fecundidade: "Se alguém quer servir a mim, que me siga. E onde eu estiver, aí também estará o meu servo. Se alguém serve a mim, o Pai o honrará"(Jo 12,26). Quantas mortes de si para amar verdadeiramente o outro: "Quem tem apego à sua vida vai perdê-la; quem despreza a sua vida neste mundovai conservá-la para a vida eterna" (Jo 12,25). E como são seres humanos que amam esse Amor divino, São João acrescenta: "Agora estou muito perturbado. E o que vou dizer? Pai, livra-me desta hora? Mas foi precisamente para esta hora que eu vim" (Jo 12,27). Mas que felicidade interior ao amar verdadeiramente! Sem dúvida, é uma cumplicidade secreta com Deus, pois quando eu me entrego com amor é quando eu mais me assemelho a ele!

Com o evangelho de hoje, estamos longe dos julgamentos, dos rechaços, das condenações e das exclusões. Isso não nos conduz a nenhum lugar, mas sim para bem longe do Deus de Jesus Cristo: "Quando eu for levantado da terra, atrairei todos a mim" (Jo 12,32). Então, como é que ainda hoje na nossa Igreja nós façamos julgamentos e condenações tão facilmente dos mais fracos dentre nós? Não há aí uma contradição com o evangelho? Quando aplicamos o Direito Canônico em lugar do Evangelho, nós contradizemos a mensagem de esperança de Cristo Ressuscitado e deformamos o rosto de Deus. Se nós cremos verdadeiramente que Cristo morreu por Amor, nós devemos crer também que está sempre vivo, pois o Amor entrega a Vida. E como nós vivemos para ele e dele, nós devemos viver no Amor, ressuscitados. Precisamos, então, passar da Sexta-Feira Santa ao Domingo de Páscoa.

3. A cruz se faz luz: Morrendo numa cruz por Amor, Cristo é ressuscitado e ele salvou a todos, sem exceção. Por que ainda hoje buscamos nos salvar? Ficamos parados ou bloqueados na Sexta-Feira Santa? O que esperamos para fazer que se levante o Sol da Páscoa? A cruz se faz luz: ela é caminho de vida. Para os crentes, ela é um ponto de referência na noite. Segui-la não é para nos contentar no sofrimento e na morte; diferentemetne, é para encontrarmos o Cristo vivo. Quanto tempo perdido nos impondo sacrifícios, privações e mortificações de todo tipo! Em lugar de gastar esse tempo em amar! Michel Hubaut escreve: "Jesus nos convida a não chorar sobre a sua paixão e a sua morte, mas a ousar seguir o seu mesmo itinerário de vida. Esse Amor que morre por amor a nós, esse amor crucificado é uma luz que atravessa as trevas das nossas provas... Ressuscitado, Jesus traçou na cova da humanidade e da nossa vida, uma corrente de luz, imprimiu uma misteriosa atração, cavou uma chamada infinita que nos coloca no caminho. Todo dom de si, todo avanço, toda morte em si mesma, molda nosso ser de eternidade. Nossa ressurreição já começou".

Para concluir, o Cristo da Páscoa realizou plenamente essa Aliança nova anunciada pelo profeta Jeremias, no momento do Exílio de Babilônia, narrativa que temos hoje na primeira leitura: "A aliança que eu farei com Israel depois desses dias é a seguinte - oráculo de Javé: Colocarei minha lei em seu peito e a escreverei em seu coração; eu serei o Deus deles, e eles serão o meu povo" (Je 31,33). Essa Aliança nova, inscrita nos corações, nos torna capazes de amar e nos convida a liberar outras pessoas de todo o que lhes impede de amar: "Porque todos, grandes e pequenos, me conhecerão - oráculo de Javé. Pois eu perdoo suas culpas e esqueço seus erros" (Jr 31,34). A Aliança nova, dizia um teólogo belga, é aquela da fé no estado puro: uma nova criação, uma recriação... É a obra da Páscoa!

sábado, 17 de março de 2012

Publicado no Cebi

Quem não crer, já está condenado. Condenado a quê? – Edmilson Schinelo

Edmilson Schinelo é colaborador do CEBI. É organizador do livroBíblia e Negritude e colaborador em outras publicações

O texto do evangelho a ser proclamado neste domingo (Jo 3,14-21) traz uma bonita e ao mesmo tempo controversa frase: Deus amou o mundo de tal maneira que entregou seu Filho único para que todo aquele que crê não pereça, mas tenha a vida eterna (Jo 3,16). Tamanho foi o amor de Deus que nos deu seu único filho! Mas por que o mesmo Deus que proibiu o sacrifício de Isaac (Gn 22) entregaria seu próprio filho? Queria o pai que seu Filho fosse morto por nós? Se não queria, por que permitiu isso? Era necessário que o Filho do Homem fosse levantado no madeiro (Jo 3,14)?

Sabemos que o quarto evangelho teve sua redação já no final do primeiro século, momento em que muita gente vinha entregando a vida pela causa do Evangelho, no serviço aos pobres, na partilha dos bens e até mesmo no enfrentamento com o Império Romano, por meio do martírio. Por outro lado, não era pequeno o grupo que contestava essa postura: para seguir Jesus bastava buscar a "iluminação", abrir-se ao conhecimento, à gnose. Para quem assim pensava, o logos era a luz ser atingida pelo esforço do intelecto, não pela prática concreta. Corrigindo esta distorção, o quarto evangelho afirma já em seu prólogo: o verbo, a luz verdadeira, fez-se carne, gente de fato, viveu acampado no nosso meio! (Jo 1, 9.14).

Procurando Jesus às escondidas

De acordo com as narrativas joaninas, havia um grupo de pessoas simpáticas ao projeto de Jesus, mas com dificuldades de assumir publicamente essa postura. Tais pessoas sempre procuravam Jesus às escondidas (Jo 3,2) e por isso a tradição os apelidou de cripto-cristãos.

Nicodemos fazia parte desse grupo. Foi modelo para muitos que, à época da redação do evangelho, não podiam ou não queriam assumir publicamente sua fé em Jesus. Pessoa influente entre os judeus, Nicodemos era fariseu e membro do Sinédrio (Jo 3,1). Mais tarde, até tentou evitar a condenação de Jesus no Sinédrio (7,50). Na versão do quarto evangelho, também foi ele quem trouxe os perfumes para a preparação do corpo do Mestre (19,39). Mas teve dificuldades de assumir publicamente seu compromisso com o Reino.

Jesus há havia dito a Nicodemos que era preciso "nascer do alto" (Jo 3,3). Num jogode palavras, era como "nascer de novo". Nicodemos não entendeu que Jesus esperava um renascer da água e do Espírito (3,5).

A conversa entre os dois segue em forma de poema, no qual se misturam as palavras de Jesus com as de quem escreveu o evangelho. E se Nicodemos tem dificuldade de procurar Jesus durante o dia, de ser testemunho aberto da luz (1,7), Jesus será elevado, para que seja visto por todo o mundo, para que o mundo seja salvo por ele.

Deus amou tanto o mundo...

O termo mundo (kósmos) é utilizado pelo quarto evangelho para designar tudo o que se opõe ao Reino, ao projeto de Jesus. Por isso, diante de Pilatos, Jesus afirma categoricamente: "O meu reino não é deste mundo" (Jo 19,26). Uma tradução possível e até melhor para esta frase seria: "Meu reino não é conforme - de acordo com - este mundo!" O mundo de Pilatos era o mundo do império romano: ocupação militar, corrupção, exploração dos pobres, violência contra as mulheres e as crianças. Jesus denuncia publicamente essa farsa, por isso é levantado no madeiro (Jo 3,14). O império o condena. É elevado ao trono, mas sua glória é a cruz.

Entretanto, mesmo denunciando esse mundo e por ele condenado, não quer a sua condenação. Deus enviou Jesus não para condenar o mundo, mas para que o mundo fosse salvo por ele (Jo 3,17). E da mesma forma que foi enviado, Jesus faz questão de afirmar que ao mundo também enviou seus discípulos (Jo 17,18).

A condenação e o assassinato de Jesus são atitudes e escolha do "mundo" e não o desejo de Deus. Temos que assumir que é nossa a culpa pela morte de tanta gente inocente. Não nos serve a atitude de Pilatos que, mesmo reconhecendo a inocência de Jesus, é conivente e autoriza a sua morte (Jo 19,6.16). Entretanto, a comunidade joanina, ao refazer a releitura de Gn 22 (a preservação da vida, o não-sacrifício de Isaac), quer ressaltar o quando Deus ama esse mundo e como deseja a conversão e a mudança de comportamento.

Quem não crer, já está condenado!

O Evangelho de João parece cair em contradição: no conjunto, insiste na salvação do mundo; aqui explicita a condenação: a luz veio ao mundo, mas muitos dos seres humanos preferiram as trevas (Jo 3,19); o mundo não o reconheceu (Jo 1,10). Quem não crer, de antemão já está condenado (Jo 3,18). Uma tradução melhor seria "julgado" (em grego, kríno). O acréscimo de Marcos modificou o texto e o verbo: além de crer, é preciso ser batizado (Mc 16,16). Quem não crer será condenado (Marcos usa outro verbo - katakríno, mais ligado a "dar a sentença")

Há quem prefira interpretar que a fé em Jesus é condição para a salvação. Estariam condenadas as pessoas que não acreditam e não aceitam a luz. É até possível que seja essa a intenção dos redatores, tamanha era perseguição do mundo sobre as comunidades à época da redação do texto. Entretanto, duas perguntas são muito importantes: Quem condena? E condena a quê?

Com certeza, quem nos condena não é Deus. Tamanho é o seu amor por nós que nos enviou seu próprio Filho! Nós mesmos/as fazemos a escolha, a opção é nossa. Estamos "no mundo", mas podemos deixar de viver "conforme o mundo".

Mas a que nós podemos nos condenar? Condena-se a si mesmo quem decide pelo projeto do "mundo". Neste sentido, "crer" é aderir, aceitar, entregar-se, integrar-se no outro projeto, o do Reino.

Não é bom que corramos o risco de nos condenar à tristeza e à frustração de quem não consegue crer que Deus nos ama e que "outro mundo é possível". Não podemos nos condenar ao individualismo e ao isolamento apregoados pela sociedade moderna. O caminho é a solidariedade, a partilha e o compromisso com quem sofre injustiças. Não fazer essa escolha é ficar na indecisão de Nicodemos. E então nos sobraria a "opção" de nos consolar levando flores e perfume ao túmulo, como esse líder dos judeus.

sexta-feira, 16 de março de 2012

Publicado no Cebi

Dia Mundial da Água completa 20 anos

O Dia Mundial da Água foi criado pela ONU (Organização das Nações Unidas) no dia 22 de março de 1992. O dia 22 de março, de cada ano, é destinado a discussão sobre os diversos temas relacionadas a este importante bem natural.

Mas porque a ONU se preocupou com a água se sabemos que dois terços do planeta Terra é formado por este precioso líquido? A razão é que pouca quantidade, cerca de 0,008 %, do total da água do nosso planeta é potável (própria para o consumo). E como sabemos, grande parte das fontes desta água (rios, lagos e represas) esta sendo contaminada, poluída e degradada pela ação predatória do homem. Esta situação é preocupante, pois poderá faltar, num futuro próximo, água para o consumo de grande parte da população mundial. Pensando nisso, foi instituído o Dia Mundial da Água, cujo objetivo principal é criar um momento de reflexão, análise, conscientização e elaboração de medidas práticas para resolver tal problema.

No dia 22 de março de 1992, a ONU também divulgou um importante documento: a "Declaração Universal dos Direitos da Água" (leia abaixo). Este texto apresenta uma série de medidas, sugestões e informações que servem para despertar a consciência ecológica da população e dos governantes para a questão da água.

Mas como devemos comemorar esta importante data? Não só neste dia, mas também nos outros 364 dias do ano, precisamos tomar atitudes em nosso dia-a-dia que colaborem para a preservação e economia deste bem natural. Sugestões não faltam: não jogar lixo nos rios e lagos; economizar água nas atividades cotidianas (banho, escovação de dentes, lavagem de louças etc); reutilizar a água em diversas situações; respeitar as regiões de mananciais e divulgar idéias ecológicas para amigos, parentes e outras pessoas.


Declaração Universal dos Direitos da Água

Art. 1º - A água faz parte do patrimônio do planeta.Cada continente, cada povo, cada nação, cada região, cada cidade, cada cidadão é plenamente responsável aos olhos de todos.

Art. 2º - A água é a seiva do nosso planeta.Ela é a condição essencial de vida de todo ser vegetal, animal ou humano. Sem ela não poderíamos conceber como são a atmosfera, o clima, a vegetação, a cultura ou a agricultura. O direito à água é um dos direitos fundamentais do ser humano: o direito à vida, tal qual é estipulado do Art. 3 º da Declaração dos Direitos do Homem.

Art. 3º - Os recursos naturais de transformação da água em água potável são lentos, frágeis e muito limitados. Assim sendo, a água deve ser manipulada com racionalidade, precaução e parcimônia.

Art. 4º - O equilíbrio e o futuro do nosso planeta dependem da preservação da água e de seus ciclos. Estes devem permanecer intactos e funcionando normalmente para garantir a continuidade da vida sobre a Terra. Este equilíbrio depende, em particular, da preservação dos mares e oceanos, por onde os ciclos começam.

Art. 5º - A água não é somente uma herança dos nossos predecessores; ela é, sobretudo, um empréstimo aos nossos sucessores. Sua proteção constitui uma necessidade vital, assim como uma obrigação moral do homem para com as gerações presentes e futuras.

Art. 6º - A água não é uma doação gratuita da natureza; ela tem um valor econômico: precisa-se saber que ela é, algumas vezes, rara e dispendiosa e que pode muito bem escassear em qualquer região do mundo.

Art. 7º - A água não deve ser desperdiçada, nem poluída, nem envenenada. De maneira geral, sua utilização deve ser feita com consciência e discernimento para que não se chegue a uma situação de esgotamento ou de deterioração da qualidade das reservas atualmente disponíveis.

Art. 8º - A utilização da água implica no respeito à lei. Sua proteção constitui uma obrigação jurídica para todo homem ou grupo social que a utiliza. Esta questão não deve ser ignorada nem pelo homem nem pelo Estado.

Art. 9º - A gestão da água impõe um equilíbrio entre os imperativos de sua proteção e as necessidades de ordem econômica, sanitária e social.

Art. 10º - O planejamento da gestão da água deve levar em conta a solidariedade e o consenso em razão de sua distribuição desigual sobre a Terra.

segunda-feira, 12 de março de 2012

O Eclesiástico e a sabedoria popular em saúde

O conteúdo do livro do Eclesiástico resulta da coleta de um conjunto de ensinamentos que circulava no meio do povo. O autor desejou deixá-los por escrito para manifestar a resistência contra os dominantes da época que queriam impor sua cultura e ciência, tirando do povo de Israel sua autoestima e negando sua sabedoria. Muitas vezes, os ditos são dispostos de maneira a constituir pequenas coletâneas, como no caso do verso que inspirou o lema da CF deste ano, “a saúde se difunde sobre a terra” (cf. Eclo 38,8). Este é o verso central de uma coleção de ditos sobre saúde e sobre o papel e a missão dos médicos e de outros profissionais que buscam preservá-la.

Essa perícope (cf. Eclo 38,1-15) está emoldurada por duas cole­ções relacionadas com o tema da saúde. O texto antecedente (cf. Eclo 37,27-31) fala sobre a temperança, especialmente como modo de preservar a saúde. O texto posterior (cf. Eclo 38,16-23) fala da morte, inevitável para homens e mulheres, mas que não deve ser causa de tristeza permanente para os que permanecem.

É importante resgatar a relação da saúde com a temperança, pois, efetivamente, a melhor forma de tratar da saúde de uma pessoa é evitar que ela adoeça. Neste sentido, convém resgatar e valorizar as práticas centradas na prevenção, na informação, na disseminação de iniciativas que ajudam na preservação da saúde. Tanto iniciativas governamentais, como campanhas de vacinação, de cuidados para evitar epidemias ou incentivo ao pré-natal, quanto as comunitárias, que estimulam modos alter­nativos de alimentação, prática de esportes, exercícios fiscos, entre outros.

O texto subsequente (cf. Eclo 38,16-23), de maneira realista, re­corda que temos um destino comum: a morte. Ela faz parte da vida. Nenhum ser vivente dela escapa. Embora reconheça que é natural a dor da separação e da perda, o compilador resgata da

sabedoria popular o conceito de ‘a vida continua’, ou seja, as pessoas que perdem seus entes queridos precisam ressignificar sua vida e não se deixarem vencer pelo desânimo. Nestas oca­siões, é tempo de manifestação da solidariedade fraterna que pode fazer brotar de novo a esperança. Desse texto já citado do Livro do Eclesiástico (cf. 38,1-15), ainda podemos extrair ensinamentos oportunos para a área da saúde pública, pois faz referência às pessoas responsáveis pela manu­tenção da saúde da população. Mais importante que curar é o trabalho de evitar que as pessoas adoeçam e promovê-las para que tenham vida em abundância. Realidade que o ditado popu­lar consagrou: “é melhor prevenir que remediar”. Sabe-se, no entanto, que apesar do esforço e do cuidado para evitar doenças, a fragilidade do corpo e do espírito acabam se revelando. Eis o tempo de recorrer ao serviço de saúde, ao ‘mé­dico’, como cita o texto bíblico (v.5), sem hesitações, pois é um dom de Deus para a saúde. Também foi o Senhor quem deu ao homem “a ciência” (v.6), por meio da qual o médico cura, elimi­na a dor e o “farmacêutico prepara as fórmulas” (cf. Eclo 38,7).

Deus providencia e coloca à disposição da humanidade todos esses dons e por meio deles “a saúde se espalha sobre terra”. O autor sugere que há colaboração entre Deus e a humanidade, por isso não se deve renunciar, nem menosprezar as conquis­tas alcançadas pela inteligência humana, pois elas são obra de Deus e meios pelos quais o criador continua sua ação no mun­do. Percebe-se assim, que a sabedoria popular assimilou uma nova forma de entender os processos de adoecimento e cura. Mesmo que a referência última seja o Deus Altíssimo, sua ação se dá também pela mediação de pessoas que se dedicam à me­dicina e em recursos que a natureza, dádiva de Deus, oferece para a arte da cura.

quinta-feira, 8 de março de 2012

A vocação de ser catequista

“Ser catequista é viver uma vocação característica dentro da Igreja. Ela é uma

realização da vocação batismal. Pelo Batismo, todo cristão é mergulhado em Jesus Cristo, participante de sua missão profética: proclamar o Reino de Deus. Pela Crisma, o catequista é enviado para assumir sua missão de dar testemunho da Palavra com força e coragem”. Doc. 59 (Estudos da CNBB), n. 44

Ser catequista é um chamado de Deus. Deus chama por meio de acontecimentos e pessoas. Seu chamado geralmente se faz através de uma mediação. Não ouvimos a voz de Deus diretamente, nem O vemos. Deus se comunica conosco através de ”sinais” ou mediações. Pode ser uma pessoa, uma leitura, o contato com a realidade humana ou um acontecimento. Seu chamado faz um forte apelo ao engajamento, à ação e ao compromisso com a Igreja.

A palavra vocação significa ação de chamar. Supõe o encontro de duas liberdades: a absoluta de Deus, que chama, e a liberdade humana, que responde a esse chamado. Qualquer pessoa pode chamar outra para dizer algo. Mas, quando usamos a palavra “vocação”, estamos falando de um chamado especial de Deus e, de outro lado, uma resposta livre, pessoal e consciente do vocacionado.

Vocação é algo que atinge decisivamente a existência de uma pessoa. Perceber através dos acontecimentos da história, assumir e viver fielmente a vocação é o caminho para os que desejam realizar a vontade de Deus, antes mesmo que a sua própria vontade.

A vocação é iniciativa de Deus que nos convoca para uma missão e é também resposta convicta que damos a Ele, colocando-nos à sua disposição. O catequista alguém que, com raízes na fé, na oração e na vida do povo, percebe a urgência de emprestar seu coração, sua voz, todo o seu ser a Deus e torna-se instrumento do seu amor e da sua bondade para uma comunidade. É a pessoa que continua o caminho aberto por tantos profetas, apóstolos, discípulos e discípulas de Jesus que deram a vida pela causa do Evangelho.

domingo, 4 de março de 2012

CF 2012

Do texto base

As ações de Jesus para com os doentes inspiraram a Igreja no exercício da caridade fraterna. Neste sentido, lemos no referido Guia Pastoral, “o mundo da saúde, em suas múltiplas expressões, ocupou sempre um lugar privilegiado na ação caritativa da Igreja. Através dos séculos, ela não só favoreceu entre os cristãos o nascimento de diversas obras de misericórdia como também fez surgir de seu interior muitas instituições religiosas com a finalidade específica de promover, organizar, aperfeiçoar e estender a assistência aos doentes, fracos e pobres”.

É importante salientar que muitos religiosos e religiosas vivem sua consagração a Deus e se incorporam na missão da Igreja por meio do serviço aos doentes e àqueles que sofrem. “O discípulo missionário abre seu coração para todas as formas de vida ameaçada desde o seu início até a morte natural”. Trata-se de uma multidão de pessoas dedicadas a trabalhar em situações difíceis e precárias, em solidariedade aos irmãos afetados pela doença, pela dor e pela morte, ajudando-os a encontrar sentido humano e cristão nessas realidades. A presença da vida religiosa suscita energias de humanização em lugares e ambientes que correm o risco de se transformarem em lugares de bandono, desespero e desumanização. Desse modo, a proximidade de Jesus aos doentes não se interrompeu: prolonga-se no tempo, graças à ação do Espírito Santo na missão da Igreja, na Palavra, nos sacramentos, nos homens de boa vontade, nas atividades de assistência que as comunidades promovem com caridade fraterna, mostrando assim o verdadeiro rosto de Deus e o seu amor.