sexta-feira, 20 de janeiro de 2012

CF 2012


Do texto-base CF 2012



Saúde e doença no Novo Testamento.

A cura do cego de nascença.

O capítulo nono do Evangelho de São João relata o encontro de Jesus com um cego de nascença enquanto caminhava nos arredores do Templo (cf. Jo 9,1-41). Há notícias de que a cegueira era extre­mamente comum no Oriente Médio. Nos textos bíblicos, fala-se sobretudo de dois tipos de cegueira. A oftalmia, doença altamente contagiosa, agravada pelo brilho do sol, pela poeira e pela areia so­pradas do deserto e pela falta de higiene. Outra forma mencionada é a cegueira senil, que resulta do avançar dos anos. De acordo com o relato evangélico, são os discípulos que, em primeiro lugar, per­cebem a presença do cego e propõem uma questão a Jesus.

A dúvida dos discípulos, ao encontrarem o cego, é de ordem teológica. “Quem pecou para que ele nascesse cego?” (cf. Jo 9,2) Seguindo a teologia tradicional, os discípulos propõem a Jesus uma pergunta pela causa da cegueira: teria o homem pecado ou teriam sido seus pais (cf. Jo 9,2), pois havia a compreensão de que o pecado dos pais poderia prejudicar os descendentes, por várias gerações. Esta forma de compreender foi objeto de ques­tionamento e de confronto com Jesus em várias ocasiões.

A resposta de Jesus aos discípulos é clara: “nem ele, nem seus pais pecaram, mas é uma ocasião para que se manifestem nele as obras de Deus” (cf. Jo 9,3). Cristo interrompe a tradição de vincular doen­ça e pecado e oferece aos discípulos, aos fariseus, aos judeus, aos familiares do cego e ao próprio cego uma catequese sobre sua missão. Jesus apresenta-se como ‘luz do mundo’ e luz que se manifesta pelas obras que realiza. Essa experiência permite que o próprio cego se transforme em discípulo.

Ao romper com a teologia corrente e afirmar que a doença não é fru­to de pecado, nem castigo de Deus, Jesus acaba também com a lógica excludente de atribuir a culpa da enfermidade a Deus e por decorrên­cia ao pecado, o que gerava e, ao mesmo tempo, legitimava a exclu­são social e religiosa de quem se achasse doente. Por isso, ao invés de se afastar do cego, como seria normal, Jesus se aproxima, cospe no chão, se abaixa e faz lama com a própria saliva e o pó do chão. Em seguida, a aplica sobre os olhos do cego e pede que ele vá se lavar na piscina de Siloé, cujo significado é “enviado” (cf. Jo 9,7). A narrativa do sinal é encerrada com a constatação: “o cego foi, lavou-se e voltou enxergando” (cf. Jo 9,7).

Depois do sinal realizado, Jesus sai de cena por um tempo e co­meça a discussão ao redor do fato de um homem que era cego e pedia esmola passar a enxergar. De um lado, aparece a incredu­lidade de vizinhos e familiares de que a mudança havia aconte­cido (de cego, o homem passou a vidente). De outro, a violação do descanso sabático que os judeus vão trazer para o centro da discussão e pedir explicações ao cego e a seus pais. Apesar de verem o bem na vida do cego, que passou a ver, condenam a ação de Jesus, pois ele tinha violado a lei do sábado.

A reação dos pais do cego diante das autoridades dos judeus, ou seja, diante daqueles que sustentam a velha lógica de que doença está sempre vinculada ao pecado, é de medo. Por isso, dizem somente saber que aquele homem é seu filho, nasceu cego e agora vê. Como aconteceu isso, não sabem. A solução é que os chefes perguntem ao próprio homem que era cego e agora vê, pois ele já é maior, ou seja, já é responsável pelos próprios atos e opiniões.

A finalidade catequética do evangelista está em evidenciar a missão de Jesus como luz do mundo. Por isso joga muito com as palavras ‘ver’ e ‘crer’. Não somente neste capítulo e neste episó­dio de alguém que não vê e não crê e depois passa a ver e crer, pois a catequese finaliza com um novo encontro de Jesus com o cego: “Tu crês no filho do Homem? Ele respondeu: Quem é, Senhor, para que eu creia nele? Jesus disse: Tu o estás vendo; é aquele que está falando contigo. Ele exclamou: “Eu creio, Senhor!” E ajoelhou-se diante de Jesus” (cf. Jo 9,35-38).

O texto termina com Jesus voltando para a cena e dialogando novamente com o cego. O novo aqui é que da cegueira física passa à cegueira espiritual, sobretudo daqueles que não querem ver. Como diz o ditado popular: “o pior cego é aquele que não quer ver”. Jesus encontrou pessoas assim e, infelizmente, também as encontramos em nossos dias. É missão da Igreja a continuidade da ação de Jesus na história para que a saúde se difunda sobre a terra.

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