segunda-feira, 12 de março de 2012

O Eclesiástico e a sabedoria popular em saúde

O conteúdo do livro do Eclesiástico resulta da coleta de um conjunto de ensinamentos que circulava no meio do povo. O autor desejou deixá-los por escrito para manifestar a resistência contra os dominantes da época que queriam impor sua cultura e ciência, tirando do povo de Israel sua autoestima e negando sua sabedoria. Muitas vezes, os ditos são dispostos de maneira a constituir pequenas coletâneas, como no caso do verso que inspirou o lema da CF deste ano, “a saúde se difunde sobre a terra” (cf. Eclo 38,8). Este é o verso central de uma coleção de ditos sobre saúde e sobre o papel e a missão dos médicos e de outros profissionais que buscam preservá-la.

Essa perícope (cf. Eclo 38,1-15) está emoldurada por duas cole­ções relacionadas com o tema da saúde. O texto antecedente (cf. Eclo 37,27-31) fala sobre a temperança, especialmente como modo de preservar a saúde. O texto posterior (cf. Eclo 38,16-23) fala da morte, inevitável para homens e mulheres, mas que não deve ser causa de tristeza permanente para os que permanecem.

É importante resgatar a relação da saúde com a temperança, pois, efetivamente, a melhor forma de tratar da saúde de uma pessoa é evitar que ela adoeça. Neste sentido, convém resgatar e valorizar as práticas centradas na prevenção, na informação, na disseminação de iniciativas que ajudam na preservação da saúde. Tanto iniciativas governamentais, como campanhas de vacinação, de cuidados para evitar epidemias ou incentivo ao pré-natal, quanto as comunitárias, que estimulam modos alter­nativos de alimentação, prática de esportes, exercícios fiscos, entre outros.

O texto subsequente (cf. Eclo 38,16-23), de maneira realista, re­corda que temos um destino comum: a morte. Ela faz parte da vida. Nenhum ser vivente dela escapa. Embora reconheça que é natural a dor da separação e da perda, o compilador resgata da

sabedoria popular o conceito de ‘a vida continua’, ou seja, as pessoas que perdem seus entes queridos precisam ressignificar sua vida e não se deixarem vencer pelo desânimo. Nestas oca­siões, é tempo de manifestação da solidariedade fraterna que pode fazer brotar de novo a esperança. Desse texto já citado do Livro do Eclesiástico (cf. 38,1-15), ainda podemos extrair ensinamentos oportunos para a área da saúde pública, pois faz referência às pessoas responsáveis pela manu­tenção da saúde da população. Mais importante que curar é o trabalho de evitar que as pessoas adoeçam e promovê-las para que tenham vida em abundância. Realidade que o ditado popu­lar consagrou: “é melhor prevenir que remediar”. Sabe-se, no entanto, que apesar do esforço e do cuidado para evitar doenças, a fragilidade do corpo e do espírito acabam se revelando. Eis o tempo de recorrer ao serviço de saúde, ao ‘mé­dico’, como cita o texto bíblico (v.5), sem hesitações, pois é um dom de Deus para a saúde. Também foi o Senhor quem deu ao homem “a ciência” (v.6), por meio da qual o médico cura, elimi­na a dor e o “farmacêutico prepara as fórmulas” (cf. Eclo 38,7).

Deus providencia e coloca à disposição da humanidade todos esses dons e por meio deles “a saúde se espalha sobre terra”. O autor sugere que há colaboração entre Deus e a humanidade, por isso não se deve renunciar, nem menosprezar as conquis­tas alcançadas pela inteligência humana, pois elas são obra de Deus e meios pelos quais o criador continua sua ação no mun­do. Percebe-se assim, que a sabedoria popular assimilou uma nova forma de entender os processos de adoecimento e cura. Mesmo que a referência última seja o Deus Altíssimo, sua ação se dá também pela mediação de pessoas que se dedicam à me­dicina e em recursos que a natureza, dádiva de Deus, oferece para a arte da cura.

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