Onde sopra o Espírito? Dom
Demétrio Valentini
por Adital - Dom Demétrio Valentini é Bispo Católico de
Jales (SP)
A festa de Pentecostes, celebrada neste domingo, lembra a
vinda do Espírito Santo sobre os primeiros cristãos, reunidos no cenáculo em
Jerusalém. Com a força do Espírito, sentiram-se animados a partir em missão.
Daí para a frente, o Espírito Santo iria conduzir a Igreja.
Ele se encarregaria de indicar os rumos, e até de antecipar os passos que os
cristãos deveriam dar.
Foi o que aconteceu, por exemplo, quando Pedro foi procurado
por Cornélio, um pagão, que o convidava a visitar sua casa. Ao entrar, Pedro se
surpreendeu, vendo que o Espírito Santo descia sobre os pagãos, da mesma
maneira como tinha descido sobre eles em Pentecostes.
Pedro então compreendeu que os pagãos eram destinatários do
Evangelho, tal como o povo de Israel. A Igreja aprendeu a estar atenta aos
sinais do Espírito, para tomar suas decisões com segurança.
Foi o que aconteceu em nossa época, com o anúncio do
Concílio Vaticano Segundo, em janeiro de 1959. O Papa João 23 não se cansava de
testemunhar que a idéia de um concílio tinha surpreendido a ele mesmo. A
certeza da inspiração divina lhe vinha da pronta adesão do povo, que de
imediato se identificou com a proposta do papa. Com esta certeza, a Igreja pôde
levar em frente a realização do Concílio.
Algumas manifestações do Espírito são fáceis de identificar.
Sobretudo quando contam com o aval do povo. A própria teologia reconhece que o
"sensus fidelium", a "intuição dos fiéis" é sinal seguro de
procedimento eclesial.
Mas existem situações mais complicadas. Nem sempre o clamor
do povo é porta-voz do Espírito Santo. Há certas manifestações, também
políticas e sociais, cuja ênfase, em vez de manifestar caminhos seguros de procedimentos
corretos, esconde interesses não confessados, e tenta forçar rumos que não
levam ao bem comum.
Por isto, não dá para colocar na conta do Espírito Santo
todas as manifestações populares. A confiança no Espírito de Deus não dispensa
o esforço de discernimento, para perceber os valores que estão em jogo.
O próprio Evangelho nos dá uma pista, quando Jesus explica
como seria o procedimento do Espírito. Disse Ele que o Espírito "não
falará de si mesmo...; mas, receberá do que é meu e vo-lo anunciará" (Jo
16, 13).
Com esta afirmação, Jesus sinaliza a necessidade de
constatar a coerência entre o que ele fez e ensinou, com as manifestações que
possam ocorrer. Para serem do Espírito, precisam estar em sintonia com as
verdades objetivas proclamadas por Cristo.
A Bíblia conta uma bonita história, para advertir da
necessidade de discernir a presença de Deus. Elias estava refugiado na caverna,
nas proximidades do monte Horeb. Foi avisado que Deus passaria naquela noite.
Ele se colocou então na entrada da caverna. Veio um forte furacão que fazia as
rochas se contorcerem. Mas Deus não estava no furacão. Depois aconteceu um
violento terremoto, que sacudiu a terra. Mas Deus não estava no terremoto.
Depois desceu um fogo devorador. Mas Deus não estava no fogo. Por fim, veio uma
brisa suave, que amenizou todo o ambiente. Era Deus que estava chegando.
Precedendo a este episódio, o mesmo livro narra a cena do
confronto de Elias com os 400 sacerdotes do deus Baal. Desafiados por Elias a
invocarem o seu deus para que fizesse descer fogo sobre a lenha da oferenda, os
sacerdotes gritaram o dia inteiro, mas não foram capazes de se fazerem ouvir
por seu falso deus. Ao passo que Elias, com poucas palavras, foi prontamente
atendido por Javé.
Há certas manifestações que se assemelham à gritaria dos
sacerdotes de Baal. Em nada contribuem para o discernimento objetivo dos
problemas a resolver. A análise objetiva da realidade é garantia mais segura do
acerto das decisões a serem tomadas.
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